19.6.06

A tua rua



(à minha mãe)

A tarde vai desaparecendo pela tua rua abaixo. E tu desces a tua rua, que é muito tua, muito nossa. Desenhando um risco imaginário, com a tua caneta, na parede enquanto a desces. Desces rua abaixo, mas sempre a subir. Sobes em cada nuvem que vai lambendo o céu. Comes chocolates. Só comes porcarias que te fazem mal aos dentes. E tens uns dentes tão bonitos.
Os teus caracóis que saltam enquanto desces a tua rua. A tua porta verde esperança. Verde dos sonhos de seres criança-menina. Eu, na mercearia, vejo-te chegar. Sei todos os teus passos, desde a escola até à tua porta, à tua rua. Os sonhos que levas na mochila, o teu lanche, quanto custa um chocolate, o quanto detestas cadernos de duas linhas, porque já sabes escrever muito bem. Eu sei tudo, mas prefiro inventar ainda mais enquanto desces a rua e te viras, antes de tocar à campainha.
E os teus olhos brilham. Brilham da cor da esperança, aos saltos, enquanto atravessas a tua rua olhando para os dois lados, e me chamas mamã.
®Anita